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segunda-feira, 6 de março de 2017

O início da advocacia criminal: afinal, com o que devemos nos preocupar?

Por Evinis Talon


Em qualquer projeto, o início é o momento em que surgem as maiores dúvidas. Por onde começar? Como começar? Quais são as bases que devem ser construídas?

Esse é um problema pelo qual passam todos que ingressam na Advocacia Criminal. Nas aulas ou nas redes sociais, recebo muitas indagações sobre como começar na área do Direito que considero a mais instigante e exigente.

No meu caso, quando decidi dar início na Advocacia Criminal, após pedir exoneração do cargo de Defensor Público, já havia suprido minhas dúvidas por meio de indagações a colegas Advogados e, principalmente, por meio da observação de seus comportamentos.

Ainda assim, sofri bastante no início da minha trajetória na Advocacia. Equivocadamente, atuei por alguns meses como "clínico geral", errei na definição de prioridades e tive problemas na estratégia administrativa a ser adotada.

Tive de aprender errando. Naquele momento, havia queimado uma ponte (exoneração do cargo que ocupava) e não pretendia ter de construir uma nova ponte (novo concurso público). Insistir na Advocacia e acertar era a única possibilidade. Ou realizaria meu sonho de ser Advogado Criminalista ou passaria fome! Simples assim.

Por saber como é difícil começar esse caminho, tento ajudar diariamente aqueles que estão começando.

De início, o Advogado deve reconhecer os graves riscos da atuação inexperiente e descompromissada na Advocacia Criminal. Esses riscos atingem não apenas o cliente, que pode sofrer sanções penais de forma injusta pela mera incompetência de seu Advogado.
Também o Advogado sofre, a médio ou longo prazo, com a sua incompetência, podendo sofrer sanções administrativas, civis e, se for o caso, penais, além do descrédito que poderá inviabilizar a sua atuação profissional ou colocá-lo no patamar de Advogados que cobram menos de 10% da tabela de honorários da OAB.

Ainda na parte de conhecimento e experiência, o Advogado Criminalista deverá saber a necessidade da constante atualização, especialmente em tempos de atualização jurisprudencial tão dinâmica.

Basta ver os exemplos da atipicidade no STF quanto ao crime de aborto e no STJ em relação ao crime de desacato. Aliás, não deve apenas reconhecer a necessidade de se atualizar, mas também saber como fazê-lo sem prejudicar a sua exaustiva rotina forense.

Também é necessário definir o que deve ser lido preponderantemente para a Advocacia Criminal.
Ao contrário de concursos públicos, que exigem um conhecimento abrangente sobre todos os assuntos de todas as disciplinas, a Advocacia Criminal exige um conhecimento significativamente intenso em relação a determinados assuntos, como nulidades no processo penal e teoria do crime.

Estudar de forma desorientada ou sem considerar os fins pretendidos é deixar de aproveitar o tempo disponível para evoluir como Advogado Criminalista.
Aliás, o estudo para exercer a Advocacia Criminal é totalmente diferente do estudo para provas e concursos. O Advogado precisa saber disso! Enquanto os examinandos precisam decorar a legislação, a análise legislativa pelo Advogado Criminalista deve ser proativa, buscando teses defensivas em cada dispositivo legal.

Nessa linha, quem se prepara adequadamente para a Advocacia Criminal conseguirá preparar um amplo catálogo com teses defensivas possíveis.

Uma das principais preocupações do iniciante na Advocacia Criminal deve ser o desenvolvimento da sua capacidade de transmitir alegações defensivas por meio escrito e/ou oral. O Advogado deve evoluir continuamente na oratória e na capacidade argumentativa. Ele se expressa por meio da palavra falada e escrita.

Se falhar nisso, os estudos terão sido em vão.
Também é necessário se preocupar com a atuação especializada na Advocacia Criminal. Quem inicia precisa descobrir como sobreviver aos meses (ou anos) iniciais como Advogado exclusivamente da área criminal.

Isso é necessário para que evolua e consiga colher os frutos futuramente. Caso contrário, sofrerá como clínico geral por muitos anos e ficará decepcionado com a falta de evolução.
Quem inicia na Advocacia Criminal precisa se preocupar principalmente com os primeiros clientes. Ouvi uma vez algo muito realista: você trabalha hoje para ganhar amanhã, mas as contas venceram ontem.

Os clientes são necessários desde o primeiro dia de Advocacia, porque, ainda que se adote uma estrutura enxuta no escritório (ou nem tenha escritório), há custos fixos e variáveis com os quais devemos nos preocupar.

Para conseguir os primeiros clientes, o Advogado Criminalista deve saber nitidamente quais são seus diferentes. Caso ainda não tenha diferenciais, deverá ter como maior preocupação a construção de valores que possam distingui-lo dos seus concorrentes.

Nesse prisma, o Advogado Criminalista precisa preocupar-se com a construção de uma marca, que é muito mais que um logotipo. Quando falo de marca, refiro-me à forma como o profissional é reconhecido.

  • É visto como alguém que detém um notável saber jurídico?
  • Ou é considerado um Advogado que consegue estabelecer boas relações interpessoais?
  • Por que alguém te contrataria em detrimento de todos os outros Advogados do país?


O iniciante na Advocacia Criminal também deve preocupar-se com a formação de parcerias realmente efetivas. Atualmente, todos são parceiros de todos, mas poucos geram resultados.

Se corretamente desenhadas, as parcerias são a forma mais efetiva de crescer profissionalmente na Advocacia Criminal, pois superam a necessidade de aguardar passivamente que clientes descubram o seu nome e te procurem sem conhecer seus diferenciais e tudo que você construiu na seara jurídica.

Em suma, quem inicia na Advocacia Criminal deve ter como principais preocupações a preparação inicial, as constantes atualizações, a evolução da oratória e da capacidade argumentativa, a conquista de novos clientes, a formação de parcerias realmente efetivas, a definição de uma marca, a atuação especializada na área criminal e a construção de diferenciais.

São preocupações que também estão presentes em outras áreas da Advocacia, mas na área criminal possuem inúmeras peculiaridades que devem ser observadas.

sexta-feira, 7 de outubro de 2016

Confiança do 40

Em nome da "ORDOJURIS.BLOGSPORT" e "ORDOJURIS JURÍDICO", queremos agradecer a "COLIGAÇÃO TRABALHO CONTINUA" pela confiança nos profissionais almejados. CAJAZEIRAS no sertão da PARAÍBA está de PARABÉNS..!!!!!!






2018 vem aí..!!!!!!!

Voçê Tambem Amola a Faca.?

Pensar o estupro como o resultado de uma ação praticada por um sujeito acometido por uma patologia apazigua parte da sociedade com ela mesma. Na medida em que acredito ser a violência o exercício de um ser “anormal”, eu me eximo da responsabilidade de pensar o quanto a dinâmica social que vivemos é machista e produz a mulher, em pleno século XXI, enquanto um ser inferior e submisso ao homem. Mais do que isso: eu tento me desresponsabilizar diante desta violência. Afinal, o que eu, “cidadão de bem”, que pago todos os meus impostos, tenho a ver com a suposta insanidade de um estuprador ou com uma violentada que não “soube se precaver”? A individualização da questão do estupro produz, por um lado, monstros e, por outro, a própria culpabilização da vítima. Além, é claro, de despontencializar o debate político em torno desta questão.
A individualização da questão do estupro produz, por um lado, monstros e, por outro, a própria culpabilização da vítima.
Podemos pensar a prática do estupro como uma relação de poder que, de certo modo, atualiza o antigo e medieval poder soberano. Este era, para Michel Foucault, “o direito de apreensão das coisas, do tempo, dos corpos e, finalmente, da vida”. Ou seja, o soberano possuía o direito ao domínio político não apenas das terras, dos bens, mas, também, dos corpos e das vidas de seus súditos. A existência destes dependia fundamentalmente da vontade soberana.
O ápice do exercício do poder soberano se dava nos suplícios, isto é, nos rituais de martírio público do corpo dos condenados. Concomitante ao domínio violento do corpo – através de sua tortura –, havia a encenação de um espetáculo. Não bastava apenas dominar e aniquilar o corpo, era preciso, antes de tudo, mostrar publicamente a sua aniquilação e a força do poder que o aniquilava. Por exemplo, não bastou enforcar “Tiradentes”. O poder soberano, representado pelo império português, esquartejou o seu corpo e o espalhou pelo país, em lugares onde o seu aniquilamento pudesse ser visto e servisse como exemplo para os demais. Este poder exigia, além de um corpo para aniquilar, uma plateia para assistir.
O patriarca brasileiro era o soberano medieval que detinha o direito de vida, morte e apreensão de tudo e de todos que eram sua propriedade, incluindo aí: sua esposa, filhos (as), escravos e demais serviçais. O machismo, a violência, a intolerância, o racismo, entre outros, compõe um emaranhado de práticas que estão na “argamassa” da construção da sociedade brasileira. Sociedade esta que, historicamente, gosta de estranhamente ver a si própria como pacífica, cordial e democrata.
Código Civil de 1916 representava o homem como o chefe da família e a mulher como “relativamente incapaz”. Até meados de 1970, a defesa da honra era utilizada para inocentar o homem que assassinava sua esposa. O estabelecimento da democracia não fez com que, por exemplo, o machismo e a violência de gênero se extinguissem. Pelo contrário, os novos arranjos das relações de poder deram a antigas práticas “novas roupagens”. O estupro é crime, mas sua tipificação no Código Penal não impede que o mesmo aconteça, pois existe uma naturalização da figura da mulher como submissa e inferior ao homem que ajuda a construir uma “cultura do estupro”. Muitos homens ainda querem se fazer como o antigo patriarca da família tradicional brasileira, recorrendo ao uso do poder soberano para tomar o corpo da mulher como sua posse e fazer dele o uso que bem quiser. Este homem machista não nasceu assim, ele é o efeito de uma produção social. Aliás, produção esta que atinge, também, as mulheres.
No caso da jovem estuprada por uma dezena de homens no Rio de Janeiro, não bastou violenta-la coletivamente; foi ainda preciso expor o seu corpo martirizado, impotente, ferido, bem como a relação de poder de dominação/aniquilação que o apreendeu, nas redes sociais. A partir daí, a tragédia da jovem ganha repercussão, transformando-se num macabro espetáculo – espécie de julgamento virtual – em que diferentes atores sociais passam não apenas a acompanhar a sua agrura, como também, a julgar moralmente supostas atitudes da mesma que teriam feito com que ela “pedisse para ser violentada”. Há um “interrogatório” na forma de posts no Facebook: “como ela estava vestida?”; Ela ia para o baile funk?”; “Ela traiu o namorado?”; “Ela estava andando tarde da noite sozinha”?Outros, sentenciam: "se ela estivesse em casa isso não aconteceria!”
O poder soberano não apenas violenta publicamente o corpo do condenado, como alimenta na população que assiste o suplício – neste caso, talvez milhares de pessoas tenham assistido o vídeo com o estupro – a produção de uma narrativa condenatória sobre a vítima. De repente, a jovem violentada se transforma em culpada pela sua tragédia. De repente, supostas fotos suas com armas nas mãos passam a circular nas redes sociais, sugerindo um envolvimento da jovem com o tráfico. Se ela estivesse, de fato, envolvida com o tráfico, poderemos esquecer esta história e dormir tranquilos e serenos, pois, o estupro foi merecido? Poderemos ficar aliviados, pois ela “plantou o que colheu”? Poderemos fingir, mais uma vez, que a violência de gênero – que mata milhares de mulheres no Brasil – é uma ideologia que as feministas estão criando? Poderemos até sorrir diante de tal acontecimento, fazer piada, pois, já que supostamente escolheu se envolver com bandido, ela perdeu o direito a humanidade?
A chamada “cultura do estupro” é diariamente alimentada por “amoladores de facas”. Estes, segundo Luís Antônio Baptista, são “aliados” das práticas que ajudam a exterminar o outro. Eles usam de seus lugares de poder para amolar facas que serão utilizadas por terceiros. Nem sempre em seu discurso é fácil perceber o seu caráter genocida. Ou seja, os amoladores de facas podem não estuprar, mas eles, com os seus discursos, estilos de vida, ajudam a criar/fortalecer as condições para que o estupro, entre outras violências, aconteça. O amolador de facas faz piada (em rede nacional) do estupro; ele culpabiliza a vítima pelo tipo de roupa que usava, pela hora que estava na rua; ele diz que machismo não existe; ele considera feminismo “mimimi”; ele homenageia estupradores do passado como se fossem heróis; ele deixa no ar que certas mulheres merecem ser estupradas; ele acredita que o corpo de sua namorada, esposa, irmã, etc. É propriedade sua; ele acredita que ser mulher é ser “bela, recatada e do lar”, etc.
Em resumo infeliz desta triste história: é muito mais fácil e cômodo condenar a menina - individualizando a questão - do que assumirmos que o machismo a estuprou – e estuprará outras - enquanto vivemos uma vida de mentiras acreditando que não temos nada a ver com isso. A prática de estupro, presente na história brasileira desde a colonização quando se fazia recorrente o estupro dos corpos das escravas negras e das índias, de certo modo, está relacionada a uma relação de poder onde podemos ver se atualizar a antiga figura do patriarca soberano, proprietário e senhor dos corpos femininos. Em média, 13 mulheres são assassinadas por dia no Brasil. Silenciar-se diante desta violência é ajudar a fazer com que ela continue, como se fosse alo natural, se perpetuando.

  • Fonte: www.portal-justificando.jusbrasil.com.br/noticias/347804971/voce-tambem-amola-a-sua-faca?
  • José Rodrigues de Alvarenga Filho é Doutor em psicologia (UFF). Autor do livro: “A ‘Chacina do Pan’ e a produção de vidas descartáveis no Rio de Janeiro” (Multifoco, 2013).

Rock`roll e o Direito Penal

É sabido por todos que o Direito Penal, apesar de ser a ultima ratio do Direito, possui grande interação com a sociedade, seja no momento de aplicar penas devidamente impostas, seja no momento de reinserir o condenado que cumpriu sua pena, sempre com a intenção de torná-lo apto para o convívio social. Vincula-se umbilicalmente ao homem, pois se apresenta como avaliador de suas condutas. Sendo assim, seria possível imaginar que um juiz de direito, na tentativa de cooperar com a reinserção social de adolescentes infratores, fundasse uma banda de rock justamente para esse fim?
Pois essa banda existe e encontra-se no Estado do Rio Grande do Sul. O magistrado Dalmir Franklin de Oliveira Júnior, que atua na Vara da Infância e Juventude, fundou uma banda de rock, tendo como parceiros justamente os jovens que por ele foram condenados por crimes de tráfico, roubo e até mesmo homicídio, com o sugestivo nome de Liberdade. Segundo noticiado, os jovens precisam, para ingressar na banda, ter bom comportamento e frequentar aulas de música no estabelecimento em que se encontram reclusos[1]. Sendo assim, essa louvável postura do magistrado remete o leitor a uma fundamental indagação: qual a finalidade da pena aplicada ao responsável pela prática de um crime? Seria apenas para castigá-lo?
Inicialmente, tem-se que nossa doutrina aponta para duas finalidades: retribuição e prevenção. A retribuição consiste na “retaliação” do Estado à pessoa que cometeu um crime. Ou seja, o Estado retribui, de modo justo, ao mal injusto que o criminoso provocou. É a sensação de castigo que irá pairar diretamente no condenado. Por outro lado, verifica-se também a finalidade preventiva da pena, que nada mais é do que a tentativa do Estado de evitar a prática de novas infrações penais. Outrossim, a finalidade preventiva ainda é dividida pela doutrina em prevenção geral e especial, sendo essas positivas e negativas.
Desta feita, reputa-se geral a prevenção que se destina a impedir a prática de crimes pela sociedade. No mais, será negativa quando tiver o poder de intimidar potenciais criminosos, no sentido de mostrar-lhes a pena e a consequência que lhes serão impostas, caso ajam da mesma maneira que a pessoa condenada. Por outro lado, a finalidade geral positiva consiste em demonstrar a vigência e a imperatividade do ordenamento penal: o Direito Penal brasileiro é válido, cogente e eficaz em todo o território brasileiro.
A prevenção especial, por sua vez, em muito se aproxima dos fatos em estudo, pois é dirigida especialmente para a pessoa do condenado. Igualmente, pode ser positiva ou negativa. Essa última, destina-se a compelir o condenado a não voltar a delinquir. Logo, objetiva evitar a reincidência. Já a prevenção especial positiva tem por objetivo a ressocialização do condenado: após o cumprimento da pena, o egresso deve ter condições de retornar ao convívio social e, mais que isso, de respeitar as regras de convivência que são a todos impostas pelo Direito. Por conseguinte, uma pena que afaste a pessoa do retorno legítimo e eficaz à sociedade não pode ser legítima, bem como a que não lhe assegure os mínimos direitos inerentes a qualquer pessoa que cumpra pena.
Deste modo, pode-se afirmar que a iniciativa do magistrado é digna de elogios, tendo em vista que busca efetivar ao máximo a finalidade especial positiva da pena: ressocializar o adolescente infrator e proporcionar a ele melhores oportunidades de reinserção social. O envolvimento com o grupo, com a música que, por si só, espanca definitivamente qualquer pretensão criminosa, irão abrir as portas para uma leitura diferenciada da vida e ver que vale a pena vivê-la com dignidade. Tenho certeza que uma das músicas entoadas pelo grupo é “É preciso saber viver”, dos Titãs, que assim retrata em um dos versos:
Toda pedra do caminho / você pode retirar / Numa flor que tem espinhos / Você pode se arranhar / Se o bem e o mal existem / Você pode escolher / É preciso saber viver.
Eudes Quintino de Oliveira Júnior, promotor de Justiça aposentado, mestre em Direito Público, pós-doutorado em Ciências da Saúde, advogado e reitor da Unorp - Centro Universitário do Norte Paulista; Antonelli Antonio Moreira Secanho é advogado, bacharel em Direito pela PUC/Campinas e pós-graduação "lato sensu" em Direito Penal e Processual Penal pela PUC/SP.