Na Vara de Família, em ação de separação judicial e respectiva reconvenção, marido e mulher acusam-se, reciprocamente de adúlteros e insistem, em vão, em discutir sobre a culpa - matéria reiteradamente espancada nos julgados dos tribunais brasileiros.
Ao longo do processo, há pérolas e troca de farpas nas petições.
"Corno...é muito estranho que esta palavra não tenha o feminino" - verbera o advogado da mulher.
"Existem mulheres cuja infidelidade é o único elo com seus maridos e este é o caso dos autos" - rebate o advogado do varão.
O juiz pede que as partes refreiem seus deslizes verborrágicos, "sob pena de, acaso reincidentes, ser ordenado que se risquem várias expressões".
* * * * *
Chega o dia da audiência.
- O ´seu´ Genildo passou a ser conhecido na vizinhança como ´o corno 7 de setembro´! - depõe uma das testemunhas.
- Por que? - pergunta, espantado, o juiz.
- Porque todo mundo sabe que a Dona Evalina, mulher dele, só dá bandeira - arremata o depoente.
* * * * *
Prossegue a solenidade.
- Eu conheci a Dona Evalina como uma mulher virtuosa. Mas depois, o ´seu´ Genildo passou a se comportar como ioiô... - depõe reticente outra testemunha.
- Ioiô, pelo que conheço, é aquele brinquedinho de criança, que se enrola no próprio cordão... - observa o magistrado.
- Pois é, o ´seu´ Genildo passou a ser ioiô...ia e voltava. Saía de casa pra ficar com outra, e quando voltava já era corno... - explica a depoente.
- Modere os termos - pede o juiz. A senhora está querendo dizer que entre as idas e vindas do marido, a esposa tinha outros homens - pondera o magistrado.
- Isto mesmo - concorda a depoente.
* * * * *
Colhido o restante da prova oral, e oferecido o parecer do Ministério Público pela procedência da ação e da reconvenção, o juiz determina que os autos lhe sejam conclusos para a sentença.
Dez dias depois aporta uma petição conjunta, firmada pelos dois advogados, juntando uma oração lapidar manuscrita de próprio punho e assinada por ambas as partes:
"Senhor, fazei com que não mais sejamos; mas se nós formos, fazei com que não saibamos; intercedei também para que fiquemos calados, para não magoar nossos amados".
No final do petitório, a informação de que marido e mulher adúlteros haviam se reconciliado, iriam mudar de cidade e de Estado e estavam pedindo a desistência da ação.
O promotor se surpreende, pede que seja designada urgente audiência de ratificação. Realizada esta, o acordo é homologado e ação e reconvenção são extintas.
Na Vara, todo mundo sabe - tim tim por tim tim - do caso, que ficou conhecido como "o processo dos cornos recíprocos".
Nenhum comentário:
Postar um comentário