Hong Kong mostrou, em poucas décadas, que a corrupção tem cura. Fez tudo certo: educação, prevenção e repressão (tudo junto). No Brasil, no entanto, prepondera a ideologia de que somos o “vale das propinas” (coirmã da ideologia do “vale das lágrimas”, que diz que passamos pela Terra apenas para sofrer, daí a necessidade de salvação).
Aqui achamos que a corrupção não tem cura. Dizem: “é da nossa cultura” (por essa via algumas autoridades e empresários tentam justificar suas bandalheiras); “está enraizada”; as bandas podres das classes dominantes, as que corrompem na casa dos bilhões (veja Petrobras, Carf, Trensalão etc.), afirmam: “desde a Bíblia já se fala em corrupção”;“sempre foi assim”. Resultado: quanto mais naturalizada, mais impune fica a corrupção.
Como
era e como ficou Hong Kong depois das medidas anticorrupção?
Diante
do rápido desenvolvimento econômico e social, se Hong Kong não tivesse
adotado medidas certeiras calcula-se que atualmente estaria no patamar
de China, México, Argentina e Indonésia, países que de acordo com o
ranking mundial de corrupção 2014, da ONG Transparência Internacional,
estão entre as posições 100º e 107º, dentre 174 países. O Brasil ocupa a
69ª posição. E Hong Kong, que nos anos 60/70 era considerado um dos
territórios mais corruptos do mundo, está na 17ª posição, à frente de
Estados Unidos e Reino Unido, por exemplo. Evolução impressionante em
menos de meio século. Como isso se tornou possível onde vigorava a
cultura do “money tea” (dinheiro do chá), que equivale ao nosso
jeitinho?
Todos os setores sociais (com destaque para a polícia)
achavam-se completamente contaminados pela “cultura da corrupção”. Em
1971 começou a grande virada, com a descoberta do caso “PF Gedber”
(policial que ficou rico com a corrupção). Ele se aposentou. Após
incontáveis protestos da população, em 1974, foi criada uma das
organizações anticorrupção mais poderosas do mundo: a Comissão
Independente Contra a Corrupção (algo que poderia ser imaginado no
Brasil, mesclando agentes do Estado com a sociedade civil). A Comissão,
inovadoramente, com três departamentos, focou em educação, prevenção e
repressão. A ponte para a solução real do problema é composta de três
vias.
Qual o seu legado? Uma só via (repressão) não funciona. É
como cortar grama, que renasce. Só indo à raiz é que se resolve o
problema. O Departamento de Operações centraliza todas as “denúncias” de
corrupção (assegurando o sigilo e dando apoio ao denunciante) e faz as
devidas investigações com rapidez. Luta com denodo pela “certeza do
castigo”. O Departamento de Prevenção difunde práticas e procedimentos
que reduziram drasticamente a quantidade de corrupção; o Departamento de
Relações com a Comunidade cuida da educação e propaga os malefícios da
roubalheira. Usa propagandas massivas. Atua em escolas, organizações
distritais, no setor público e no privado: educa os jovens, difundindo
ética e moralidade aos cidadãos. Em todas as apresentações as
personagens protagonizam dilemas éticos, vencendo sempre o honesto.
O
Índice de Liberdade Econômica 2012, da Fundação Heritage, com sede nos
Estados Unidos, apontou uma tolerância mínima para a corrupção em Hong
Kong e eficácia exuberante nas medidas anticorrupção da cidade. Em outra
pesquisa, feita pela ICAC, numa escala de 0 a 10 onde zero é extremante
intolerante à corrupção e 10 totalmente tolerante, os cidadãos de Hong
Kong obtiveram uma média de 0,8 pontos na última década. Mudanças de
valores são mais importantes que apenas reformar as leis penais. A via
repressiva exclusiva, sobretudo quando populista, satisfaz a ira da
população irada, mas não resolve o problema. Se Hong Kong, uma nação que
tinha uma posição muito pior que a do Brasil anos atrás conseguiu, por
que não podemos conseguir?
Nenhum comentário:
Postar um comentário