- Saí de casa Dr.(a)! E agora?
Já acompanho o JusBrasil há algum tempo e sempre com o interesse
voltado para os artigos e jurisprudências publicados. Todos de grande
qualidade e acerto!
Recentemente tornei-me Advogado Pro com o
objetivo de melhor utilizar os recursos disponibilizados para todos que
desejam crescer na profissão. Certamente esse é o meu desejo.
Nos últimos dias percebi que as seguintes perguntas apareceram com muita frequência. São elas:
I. se eu sair de casa eu perco meus direitos na divisão dos bens?;
II. se eu sair de casa eu perco o direito a guarda dos filhos?;
III. se eu sair de casa eu posso ser “acusado (a)"de abandono do lar?
O
Direito chama isso de “Término da Sociedade Conjugal e suas
consequências”. Os advogados estudam esse título de forma geral e, mais
especificamente o Divórcio e a Separação.
Mas os leitores (as) do
JusBrasil não estão interessados no que os advogados estudaram na
faculdade. O público em geral quer saber as respostas, sem juridiquês, para a famosa pergunta: “E agora doutor (a)?”
Então, vamos lá! E por favor, me corrijam onde eu estiver enganado.
- Primeira pergunta
Antes
de responder diretamente essa pergunta, preciso esclarecer uns pontos.
Existem várias espécies de casamento (pelo menos sete) e cada uma possui
requisitos e efeitos distintos. Existem também, diferentes regimes de
casamentos e, logicamente, com efeitos e consequências diferentes.
A união estável (que não é casamento) é reconhecida pela Constituição Federal como uma “entidade familiar” (Artigo 226, § 3º, CRFB/1988) e por isso, possui alguns “privilégios”.
Como a grande maioria dos casamentos adota o regime da comunhão parcial de bens (Artigos
1.640, 1.658 e 1.660, I, todos do Código Civil) e, também, a grande
maioria das uniões estáveis é declarada (ou reconhecida) com esse
regime, a resposta para essa primeira pergunta levará em conta essa forma de divisão de bens. Sim, porque é isso que a primeira pergunta “quer saber”: como fica a divisão de bens e direitos?
Tendo isso em mente, vamos então para a resposta:
I. se eu sair de casa eu perco meus direitos na divisão dos bens?
Não! Não perde nenhum direito na divisão dos bens desde que esses bens tenham sido comprados durante o casamento
ou união estável! Essa é a regra geral. Claro que existem algumas
exceções (sete para ser mais exato) e estão listadas no artigo 1.659 do Código Civil. Mas de forma geral, tudo o que foi adquirido durante o casamento ou união estável pertencem aos dois!
“Mas
Dr (a), a casa (ou o apartamento, ou o terreno, ou o carro etc) está só
no nome dele (a)? Mesmo assim eu tenho direito na divisão?”
Sim! Tem direito sim! Não importa no nome de “quem” está a casa (ou o apartamento etc). O que importa é que os dois compraram juntos e durante o relacionamento. É o que declara o artigo 1.660, I, do Código Civil.
Qual é a explicação para isso? Simples!
“Uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa!”
O
ato de “sair de casa” porque não quer mais viver com a outra pessoa,
quer dizer exatamente isso: que ela não quer mais aquele relacionamento!
Ou seja:
“Uma coisa é o relacionamento e outra coisa é a propriedade!”
Uma
das formas de relação entre duas pessoas naturais, mais conhecidas como
“pessoas físicas”, é o casamento (ou união estável). E quando se quer
terminar essa relação, usa-se o divórcio/separação.
Uma das
formas de relação entre as pessoas “físicas” e um bem (casa etc) é a
propriedade. Quando se quer terminar essa relação, o mais comum é vender
ou doar esse bem.
- Segunda pergunta
I. se eu sair de casa eu perco o direito a guarda dos filhos?
Não! Não perde a guarda dos filhos!
Qual é a explicação para isso? É a mesma que a anterior. E é simples!
“Uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa!”
O que devemos lembrar é que o direito a guarda dos filhos tem a ver com o poder familiar (artigo 226, § 5 da CRFB de 1988 c/c artigo 1.631 do Código Civil) que, por sua vez, tem a ver com o fato de ser pai ou ser mãe.
Quando se termina um casamento ou união estável, a principal consequência é que agora, você não é mais marido (daquela mulher) ou mulher (daquele marido). Da mesma forma para a união estável: você não é mais companheiro (a). O nome é o que menos importa.
O que realmente importa é que, com o divórcio, o que se deseja terminar é a relação matrimonial (de matrimônio). E o término da relação matrimonial não termina a relação de pai e mãe (artigo 1.632 do Código Civil). Portanto:
“Uma coisa é a relação matrimonial e outra coisa é o poder familiar!”
- Terceira pergunta
I. se eu sair de casa eu posso ser “acusado (a)" de abandono do lar?
Não! Não pode ser acusado (a) de abandono do lar!
Qual é a explicação para isso? Bem, não é a mesma que a anterior. Mas é bem simples também!
Vamos imaginar a seguinte situação:
“Ele
(a) chega em casa e diz que não dá mais. Que eles não podem mais
continuar a relação, que eles não se entendem mais e que um deles terá
que sair de casa.”
Após algumas conversas e alguns dias, chegam a
uma conclusão. De que a melhor solução para o momento é que ele (a)
deve sair de casa.
Chamamos o que houve nessa situação de acordo entre as partes! E se houve acordo, não existe a menor possibilidade de existir abandono do lar!
Vamos
“esquentar” um pouco a situação. Vamos acrescentar grandes discussões,
gritarias, xingamentos e escândalos, e até vias de fato, ou seja, tapas e
bofetões!
Excetuando as agressões físicas que são de natureza criminal, ainda assim existe um acordo.
“Mas
Dr (a), eu fui expulso (a) de casa. Eu não queria sair. Eu fui obrigado
(a) a sair. Foi horrível o vexame porque ele (a) jogou todas as minhas
roupas pela janela! Então, isso não foi um acordo! Foi?”
Não
foi um “comum acordo”, ou seja, um acordo onde as duas partes
concordaram com a mesma solução. Mas foi um “acordo forçado”, um acordo
onde uma das partes foi obrigada a aceitar os termos.
Para esses
casos, a lei prevê a “separação de corpos”. O ideal é que o divórcio
resulte de uma negociação entre as partes, e que essa negociação seja
feita de forma tranquila e consensual. Às vezes isso é impossível. Para
evitar situações como o exemplo acima, o juiz determina o afastamento de
um dos cônjuges do domicílio do casal.
Lembre-se que somente a
justiça, por meio do juiz, pode “forçar esse acordo” porque somente ele
(o juiz) tem esse poder legal. Ninguém mais!
E quando o juiz
determina a separação de corpos, não dizemos que ele forçou um acordo.
Dizemos que houve uma determinação judicial de separação de corpos, e
essa determinação tem que ser obedecida! Claro!
Até porque, a única pessoa que pode determinar que você saia da sua própria casa é o juiz.
Então, voltando à pergunta, o quê seria abandono do lar?
Para
se caracterizar o abandono do lar, a pessoa tem que sair de casa sem
avisar ninguém para onde vai, quando volta e até mesmo se vai voltar! A pessoa simplesmente some! “Desaparece do mapa!” É o que dispõe o artigo 1.240-Ado Código Civil.
E
não só isso. Pela lei, essa situação de "sumiço" ter que permanecer por
mais de dois (2) anos seguidos. Dois anos seguidos sem a menor notícia
daquela pessoa! Isso é abandono do lar!
Se depois de um ano e
meio a pessoa manda uma carta dizendo onde está, já não é mais abandono
do lar porque ela deu notícias. Mesmo que ela não volte. O simples fato
de ela ter dado notícias já interrompe a caracterização do abandono do
lar pelo simples fato de essa pessoa ter mostrado um desejo de vínculo
com o antigo lar. Ainda que seja uma demonstração bem pequena.
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