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segunda-feira, 19 de novembro de 2012

Seca e Morte no Nordeste e Normas Juridicas Sem Valor Algum.


Agricultor nordestino alimentando o gado
           A distribuição de recursos hídricos no planeta é desigual, e essa situação impõe a existência de conflitos que geram a sensação de insegurança. Em pese em um país como o Brasil, existem áreas que fazem parte da maior bacia hidrográfica do mundo – a do rio Amazonas-, e outras onde a escassez e mau gerenciamento de recursos hídricos levam a seca e consequente falta de água para os humanos, acarretando também dessedentação de animais. Trata-se de um fenômeno natural, caracterizado pelo atraso na precipitação de chuvas ou a sua distribuição irregular, que acaba prejudicando o crescimento ou desenvolvimento das plantações agrícolas. O problema não é novo, nem exclusivo do Nordeste brasileiro. Ocorre com freqüência, apresenta uma relativa periodicidade e pode ser previsto com uma certa antecedência. A seca incide no Brasil, assim como pode atingir a África, a Ásia, a Austrália e a América do Norte. A atribuição que as nações têm dado a água como de valor econômico é o móvel da existência desses conflitos e de outros que surgiram, além é claro do ora em análise que se desenvolve no sertão baiano, decorrente dessa má distribuição de água no mundo. Malgrado o Brasil seja visto como um dos países com menor escassez de água, a falta desses recursos existe ou em alguns casos, por ser mal distribuído, como ocorre na região nordeste. Todavia, temos que a partir do pressuposto que a água é bem “finito”,estando em vias de escassez em algumas localidades do planeta.  Todavia, temos que a partir do pressuposto que a água é bem “finito”, estando em vias de escassez em algumas localidades do planeta.
          Em decorrência dessa constatação, alguns países têm atribuído à água valor econômico, e como todo bem que possui valor e conteúdo econômico, produz interesses que se divergentes emergem para conflito. Com efeito, ante essa constatação, temos que a análise do grave abalo ambiental vivenciado nessas regiões que tem como consequência as questões socioeconômicas e jurídicas, notadamente nos aspectos que envolvem o tema segurança pública.  Dado o má gerenciamento e escassez de recursos hídricos no solo do nordeste do Brasil, em relação as demais regiões do Brasil, os furtos de grandes quantidades de água e conflitos de terras em áreas que possuam mananciais de água são recorrentes e afetam diretamente o equilíbrio e a sensação de segurança local. No Nordeste, de acordo com registros históricos, o fenômeno aparece com intervalos próximos a dez anos, podendo se prolongar por períodos de três, quatro e, excepcionalmente, até cinco anos. As secas são conhecidas, no Brasil, desde o século XVI. As chuvas no semi-árido nordestino normalmente ocorrem de dezembro a abril. Quando elas não chegam até março, é sinal de que haverá seca. Muitas vezes fica sem chover dois ou três anos; em casos excepcionais, a falta de chuvas pode durar até cinco anos, como aconteceu de 1979 a 1984. A seca se manifesta com intensidades diferentes. Quando há uma deficiência acentuada na quantidade de chuvas no ano, inferior ao mínimo do que necessitam as plantações, a seca é absoluta. Em outros casos, quando as chuvas são suficientes apenas para cobrir de folhas mas não permitem o desenvolvimento normal dos plantios agrícolas, dá-se a seca verde.

Essas variações climáticas prejudicam o crescimento das plantações e acabam provocando um sério problema social, uma vez que expressivo contingente de pessoas que habita a região vive, verdadeiramente, em situação de extrema pobreza.  A seca é o resultado da interação de vários fatores, alguns externos à região (como o processo de circulação dos ventos e as correntes marinhas, que se relacionam com o movimento atmosférico, impedindo a formação de chuvas em determinados locais), e de outros internos (como a vegetação pouco robusta, a topografia e a alta refletividade do solo). Muitas têm sido as causas apontadas, tais como o desflorestamento, temperatura da região, quantidade de chuvas, relevo topográfico e manchas solares. Ressalte-se, ainda, o fenômeno "El Niño", que consiste no aumento da temperatura das águas do Oceano Pacífico, ao largo do litoral do Peru e do Equador.  A ação do homem também tem contribuído para agravar a questão, pois a constante destruição da vegetação natural por meio de queimadas acarreta a expansão do clima semi-árido para áreas onde anteriormente ele não existia.  A seca é um fenômeno ecológico que se manifesta na redução da produção agropecuária, provoca uma crise social e se transforma em um problema político. As conseqüências mais evidentes das grandes secas são a fome, a desnutrição, a miséria e a migração para os centros urbanos (êxodo rural). Geralmente o problema da seca costuma ser exagerado, de tal maneira que a maioria das pessoas pensa que ela é a maior causa da pobreza no Nordeste. Na verdade, o problema principal do Nordeste é de ordem social e tem origem não na escassez ou falta de chuvas, mas na desigual distribuição da terra e da renda gerada na região. Ao transformar a seca na grande culpada pelos males nordestinos, está-se criando o chamando “mito da seca”. Simultaneamente, existe a tão falada mas nunca erradicada “indústria da seca”. Trata-se de um conjunto de expedientes ou procedimentos de poderosos grupos nordestinos que se valem do fenômeno e sobretudo do mito da seca para colherem benefícios governamentais em proveito próprio.
 

vantagens ou favores: afilhados ou parentes, redutos eleitorais, etc. Ao mesmo tempo, sob a argumento de que ficaram arruinados com a seca, empresários não só deixam de pagar suas dividas bancárias, como ainda conseguem novos empréstimos em condições especiais.
          No que se refere às tentativas de solução do problema, o governo A questão da seca não se resume à falta de água. A rigor, não falta água no Nordeste. Faltam soluções para resolver a sua má distribuição e as dificuldades de seu aproveitamento. É "necessário desmistificar a seca como elemento desestabilizador da economia e da vida social nordestina e como fonte de elevadas despesas para a União ...desmistificar a idéia de que a seca, sendo um fenômeno natural, é responsável pela fome e pela miséria que dominam na região, como se esses elementos estivessem presentes só aí". Alimentando de forma dramática o noticiário sobre a seca veiculado pelos meios de comunicação, esses grupos conseguem obter do governo verbas e auxílios a título de socorro às regiões atingidas pela falta de chuvas. Porém, a ajuda governamental beneficia muito mais os membros de tais grupos do que a população efetivamente castigada pela seca. Ao controlarem a distribuição do dinheiro recebido, fazendeiros e políticos de influência – vereadores, deputados etc. – manipulam a ajuda a ser concedida, dirigindo-a para pessoas e lugares de onde possam obter é influenciado a conseguir grandes obras, como barragens e enormes açudes, que consomem formidáveis verbas públicas. A maior parte dessas verbas vai para o pagamento das empresas construtoras, muitas vezes ligadas direta ou indiretamente a pessoas que fazem parte dos grupos dominantes regionais. Além disso, as obras grandiosas geralmente beneficiam apenas aos grandes fazendeiros e não aos que realmente sofrem com a seca – os pequenos produtores. Quando de pequeno porte, os açudes construídos pelo governo são feitos em terras de grandes fazendeiros, que integram os grupos favorecidos pela “indústria da seca”.  Nessas condições, não é de estranhar que o problema das secas não se resolva. Sua efetiva solução deitaria por terra os interesses mesquinhos de grupos poderosos, que conseguem vantagens com a pobreza e o sofrimento de milhares de nordestinos.  A tragédia da seca encobre interesses escusos daqueles que têm influência política ou são economicamente poderosos, que procuram eternizar o problema e impedir que ações eficazes sejam adotadas. A idéia de resolver o problema da água no semi-árido foi, basicamente, a diretriz traçada pelo Governo Federal para o Nordeste e prevaleceu, pelo menos, até meados de 1945. Na época em que a Constituição brasileira de 1946 estabeleceu a reserva no orçamento do Governo de 3% da arrecadação fiscal para gastos na região nordestina, nascia nova postura distinta da solução hidráulica na política anti-seca, abandonando-se a ênfase em obras em função do aproveitamento mais racional dos recursos.
             Como ações emergenciais, tem-se apelado para a distribuição de alimentos, por meio de cestas básicas e frentes de trabalho, criadas para dar serviço aos desempregados durante o período de duração das secas, dirigidas para a construção de estradas, açudes, pontes. Não é possível se eliminar um fenômeno natural. As secas vão continuar existin  do. Mas é possível conviver com o problema. O Nordeste é viável. Seus maiores problemas são provenientes mais da ação ou omissão dos homens e da concepção da sociedade que foi implantada, do que propriamente das secas de que é vítima.  Soluções implicam a adoção de uma política oficial para a região, que respeite a realidade em que vive o nordestino, dando-lhes condições de acesso à terra e ao trabalho. Não pode ser esquecida a questão do gerenciamento das diretrizes adotadas, diante da diversidade de órgãos que lidam com o assunto. Medidas estruturadoras e concretas são necessárias para que os dramas das secas não continuem a ser vivenciados.

quinta-feira, 8 de novembro de 2012

Os Frutos Juridicos com o Pré-Sal.

          Considerando que estamos no Terceiro Milênio na contagem do calendário gregoriano, é recente a preocupação com o meio ambiente, pois antes preocupava-se com a evolução industrial, com o desenvolvimento e progresso técnico e científico. Acrescento que o direito ao meio ambiente é o mais conhecido dos chamados direitos de terceira dimensão, pois com o fim da Segunda Guerra em 1945, o homem se vê ameaçado na própria existência como espécie do gênero animal, como consequência, dentre outras, da destruição em massa do poderio bélico das nucleares, notadamente a bomba atômica que dizimou Hiroshima e Nagazaki. A partir deste marco temporal, a Guerra foi vista como um meio pernicioso de resolução dos conflitos, conforme se constata da Carta da Organização das Nações Unidas (ONU) e da Declaração Universal dos Direitos Humanos em 1948. O primeiro marco histórico relevante acerca do Direito Ambiental é a arbitragem da Fundição de Trail (Trail Smelter Case, de 1941), em que Estados Unidos e Canadá, por conta dos efeitos da fumaça tóxica e das partículas de cobre de uma fundição de cobre e zinco, no Canadá, cujos resíduos eram transportados pelo vento até os EUA. A soberania do país era vista de forma mais ampla, sem limitação alguma de ordem jurídica. O Direito, até este momento, ainda se pautava muito pelo caráter da individualidade, seja da nação frente à comunidade internacional, seja do ser humano enquanto indivíduo.
          Partindo deste fato, os EUA assumiram como seu o direito das vítimas do referido dano ambiental e postulou em seu próprio nome, perante o Canadá, uma série de reivindicações, por meio de um tribunal arbitral ad hoc. A decisão dos árbitros foi no sentido de que: nenhum Estado tem o direito de usar seu território ou de permitir o uso deste de tal maneira que cause dano em razão do lançamento de emanações no – ou até o –território de outro Estado.
Plantaforma do Pré-sal.
          Conforme a doutrina majoritária, esse laudo é a primeira manifestação de uma defesa judicial do direito ao meio ambiente. Esta seria a base remota para a justificação do Princípio 21 da Declaração de Estocolmo de 1972 e do Princípio 2 da Declaração do Rio de 1992. Acerca da responsabilidade estatal pelos danos ao meio ambiente, vale destacar a existência de diversas convenções internacionais ou acordos não estatais, como a Convenção de Bruxelas de 1989 sobre Responsabilidade Civil por danos causados por poluição por óleo; a Convenção de Viena sobre Responsabilidade Civil por Danos Nucleares de 1963, a Conferência de Estocolmo, de 5 a 16 de junho de 1972, dita Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano. Recentemente tive o grande prazer de reencontrar com a brilhante advogada e uma das maiores especialistas no Direito do Petróleo e Gás no Brasil Dra. Maria Pietro. Nesta oportunidade, foi importante perceber, como o País necessita de profissionais do quilate da Ilustre Professora Adriana Tinoco Vieira Fixel, consultora jurídica ambiental na Indústria do Petróleo, que declaro sincera admiração. Após diálogos e troca de correspondências eletrônicas, reafirmo o convencimento na defesa do entendimento, quanto à íntima ligação entre: meio ambiente e sua importância na ordem econômica, do petróleo e gás, ascensão social de comunidades e a tributação. Entendendo, assim, tributação como vetor dos interesses difusos e como meio coadjuvante na tutela do meio ambiente equilibrado, constitucionalmente garantido nos artigos 170, VI e 225 da Constituição Federal, podendo sugerir os rumos à Indústria do Petróleo e Gás, atingindo de forma positiva a população do entorno. Assim, observa-se com muita clareza. Buscando não aprofundar, por ora, neste tema, mas apenas demonstrar que a criação de um tributo pode não estar ligada à arrecadação propriamente dita, mas, na demonstração do desejo do Estado em indicar um caminho a ser percorrido por uma determinada atividade. Em resumo, regras de natureza tributária que podem ser utilizadas para orientar condutas ecologicamente corretas.
          Após as últimas semanas, tornou-se moderno e atual debater sobre o pré-sal. A imprensa, empresários, executivos, políticos, apresentam suas visões e projetos sobre o novo tesouro depositado abaixo da grande camada de sal no fundo do oceano. Acertadamente, ninguém quer ficar à margem desta discussão e, esta importância, se manifesta também no governo, quando o Presidente da República, envia quatro projetos sobre o marco regulatório do pré-sal ao Congresso Nacional (PL 5938, PL 5939, PL 5940 e PL 5941), em regime de urgência constitucional, que força a análise em apenas 45 dias para cada casa legislativa. Entretanto, alguns meses atrás o discurso era outro. Falava-se sobre energia renovável, vantagens ambientais do álcool sobre a gasolina, incentivo ao biodiesel e incremento das pesquisas com energia advinda da biomassa. Em inúmeras empreitadas se buscou vender no exterior a imagem que o combustível renovável era mais adequado na luta contra o aquecimento global. O fato é, que de forma potencialmente divina, o território brasileiro foi agraciado com abundantes estoques de petróleo e gás, com expectativas mais que surpreendentes. Localizados na camada pré-sal, bem abaixo do solo oceânico e a cerca de 300 km da costa e com grande ênfase nos estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Espírito Santo. Embora ícias desta importância não sejam descobertas “do dia para noite”, na maioria das vezes sua vazão é controlada politicamente ou de acordo com a utilidade econômica. Com o foco direcionado para o pré-sal, o Governo Federal busca normatizar com enorme rapidez e com pouco aprofundamento por parte do Poder Legislativo, embora na Câmara, já tenham sido criadas quatro comissões específicas para estudos. Contudo, o tempo é curto e não haverá espaço para debates com a sociedade. Mas, com certeza, o centro das discussões versará sobre a distribuição das benesses financeiras do “ouro negro”, “royalties”, discutindo se a regulamentação, incorporará o espírito “Robin Hood”, sabendo distribuir as fartas rendas oriundas da exploração de petróleo e gás ou não. Os estados potenciais produtores defendem uma maior participação. Os estados nordestinos buscam a distribuição equânime entre todos os entes federados.

Em uma análise fria, em tese, os produtores correm maiores riscos de contaminação em caso de acidentes. Contudo, objetivamente, todos buscam maiores fatias dos recursos, para efetuaram seus investimentos de acordo com as prioridades do seu povo, seus governantes e eleitores.Cientes que, iniciou-se um novo discurso, perdeu-se um pouco no avanço da política de utilização de energia renovável, fazendo com que o interesse meramente econômico, supere as discussões acerca da biomassa e combustível não-fóssil, fazendo com que o governo, em um primeiro momento, desacelere o discurso “bio-energia” e, isso alterará, de forma discreta o incentivo daqueles que iniciaram e investiram no propagado modelo “bio”.

          Não restam dúvidas que o risco de acidentes, com maior potencial poluidor fica por conta do petróleo, é fato concreto e histórico. A União precisará trabalhar com o gerenciamento de riscos, desenvolvendo melhores campanhas de mitigação e, principalmente avaliação de externalidades negativas, visando não socializar o dano. A preocupação se configura bastante diferenciada e está na possibilidade de ocorrência de acidentes a cerca de 7.000 metros de profundidade. Não se conhece a real potencialidade de um dano nestas condições. Para exemplificar, havendo um vazamento de óleo, em uma embarcação petroleira, causa grandes danos ao meio ambiente em uma baía. Como mitigar efeitos de um acidente, com potencial semelhante, em condição tão crítica? Baixa ou nenhuma visibilidade, alta pressão, flora e fauna marinhas praticamente desconhecidas nesta profundidade, impossibilidade de intervenção imediata dentre tantas outras pouco avaliadas. Com tantos recursos sendo disputados, deve-se priorizar a criação de um Fundo para geração de novas tecnologias de segurança e mitigação para pré-sal. O Fundo poderia ser constituído de fontes diversas, como: recursos das sanções advindas do princípio poluídor-pagador; parcela dos tributos considerando a extrafiscalidade para nortear os objetivos pretendidos pela administração pública em conjunto com a sociedade, taxas, dentre outros.
          A proposta da primeira parte deste artigo será trazer ao centro da discussão, que o festejado marco regulatório do pré-sal, não poderá estar desvinculado das preocupações com a tutela do meio ambiente e que o tributo poderá, não apenas, cingir-se como ferramenta de arrecadação, mas pode ser um vetor de prioridades, com a finalidade de cumprir o que constitucionalmente o artigo 225 da Constituição Federal, determina.
  • Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
        Considerando os conceitos de mar territorial, plataforma continental, zona contígua e zona econômica exclusiva constante da Convenção de Montego Bay, legítimo o direito do Brasil de explorar os recursos petrolíferos na camada do pré-sal, por meio de plataformas artificiais de prospecção e de exploração de petróleo na plataforma continental submarinha. Não obstante este direito, a preservação do meio ambiente marinho ecologicamente equilibrado tem que ser uma constante no desenvolver da atividade econômica. Esta preocupação ganha destaque se lembramos que ainda em 2011 houve um vazamento de óleo com proporções até hoje sentidas na bacia de Campos. Ressalte-se no tocante às plataformas artificiais que a pouco mais de dez anos tivemos o afundamento de toda a Plataforma P-36 da Petrobrasno Rio de Janeiro.O vazamento de petróleo não é privilégio do Brasil, recentemente tivemos o vazamento no Golfo do México em que a sangria do poço de petróleo durou mais de um mês, causando desastreambiental de proporções incalculáveis. A exploração dos recursos naturais na zona econômica exclusiva é legítima, porém jamis há de se perder de foco a observância ao princípio da precaução, tão caro e tão essencial ao Direito Ambiental.

quarta-feira, 7 de novembro de 2012

Delação Premiada No Processo Juridico Brasileiro.

          O legislador, influenciado principalmente pela legislação italiana, criou uma causa de diminuição da pena para o associado ou partícipe que entregar seus companheiros, batizada pela doutrina de "delação premiada". Lei n.º 8.072/90, art.8º, § único – O participante que denunciar à autoridade o bando ou quadrilha, possibilitando seu desmantelamento, terá a pena reduzida de 1 (um) a 2/3 (dois terços). Também aplicou a redução ao crime de extorsão mediante seqüestro, através da adição do § 4º ao art. 159 do Código Penal. § 4º - Se o crime é cometido em concurso, o concorrente que o denunciar à autoridade, facilitando a libertação do seqüestrado, terá sua pena reduzida de um a dois terços. A delação premiada vem sendo severamente criticada. Sob o ponto de vista sócio-psicológico ela é considerada imoral ou, no mínimo, aética, pois estimula a traição, comportamento insuportável para os padrões morais modernos, seja dos homens de bem, seja dos mais vis criminosos.
Sob o aspecto jurídico, indiretamente rompe com o princípio da proporcionalidade da pena, já que se punirá com penas diferentes pessoas envolvidas no mesmo fato e com idênticos graus de culpabilidade. Questiona-se ainda sua aplicabilidade, argüindo que a delação premiada se revela um instrumento inócuo, de rara aplicação. Qual o criminoso, em sua sã consciência, ainda que tentado pelos benefícios oferecidos, se sujeitará a carregar a pecha de alcagüete, de traidor, ciente de que no submundo – incluindo a prisão – receberá a morte pela delação? Em termos práticos, não basta a mera delação para que o criminoso se beneficie, deve resultar a delação na efetiva libertação do seqüestrado, ou, nos casos de quadrilha, associação criminosa ou concurso de agentes, na prisão ou desmantelamento do grupo. No sistema penal codificado brasileiro, tendo como fundamento o "estímulo à verdade processual" (Exposição de Motivos da Lei n. 7.209/84), está prevista a "confissão espontânea" (CP, art. 65, III, "d") como circunstância atenuante".
          Com a evolução dos tempos e aumento da criminalidade, cada vez mais sofisticada, aos poucos se foi introduzindo "delação premiada" como forma de estímulo à elucidação e punição de crimes praticados em concurso de agentes, de forma eventual ou organizada, como se vê em diversos textos, como § 4º, do art. 159, do Código Penal, com redação dadas pelas Leis ns. 8.072/90 e 9.269/96; § 2º, do art. 24, da Lei n. 7.492/86, acrescentado pela Lei n. 9.080/95; par. único do art. 16,da Lei n. 8.137/90, acrescentado pela Lei n. 9.080/95; art. 6º, da Lei n. 9.034/95 e § 5º, do art. 1º, da Lei n. 9.613/98).
          No entanto, dificilmente se encontrava algum agente, ou mesmo vítima ou testemunha capaz de delatar na linguagem corrente, "esta palavra adquiriu conotação pejorativa, tomando o sentido de acusação feita a outrem, com traição da confiança recebida, em razão de função ou amizade"], porquanto não havia qualquer forma de garantia ou sistema de proteção da segurança do próprio delator ou de sua família, que ficava jogado à própria sorte; a doutrina reclamava a instituição de programa específico para proteção das vítimas e testemunhas, pois o "código do silêncio" revelou-se ser uma das principais dificuldades no combate à criminalidade, diante do temor das pessoas em testemunhar fatos delituosos presenciados ou dos quais tenham sido vítima ou deles participado. A delação premiada pode ser pedida de forma espontânea pelo próprio réu, através de seu advogado ou muitas vezes até pelo promotor que sugere ao acusado que conte o que sabe sobre os comparsas. Ele recebe em troca o oferecimento de uma pena menor no final do julgamento, bem abaixo da pena que será dada aos companheiros de crime.  Quando chegar a hora e o acusado for a julgamento, o juiz então avalia e decide se as informações prestadas pelo réu ajudaram ou não nas investigações, na elucidação do crime e na prisão de outros envolvidos. Se considerar que as informações foram importantes, o juiz concede o prêmio. Se considerar que o réu mentiu, ele não reduz a pena e ainda o processa por delação mentirosa. Ao entrar no serviço de delação premiada, o réu deverá informar à polícia e à justiça tudo o que sabe: nomes, dados, endereços, telefones, locais que os comparsas costumam frequentar e eventuais esconderijos. Ele não precisa apresentar provas, mas é necessário que no decorrer das investigações a polícia consiga confirmar que as informações são verdadeiras.
O que diz a lei
  • Delação premiada é uma prerrogativa legal que extingue ou atenua a punibilidade de um "réu-colaborador" – participante de um delito – que age proativamente no sentido de ajudar a Justiça com informações importantes à elucidação do crime e da identificação de co-autores. A Lei sobre a delação premiada está no Código Penal Brasileiro, em seu artigo 159, parágrafo quarto, e também na Lei número 9.807/99, nos artigos 13 e 14. Leia abaixo a transcrição desses artigos:
 
Artigo 159:
  • Sequestrar pessoa com o fim de obter, para si ou para outrem, qualquer vantagem, como condição ou preço do resgate: Pena: reclusão de oito a quinze anos.
  • § 4° - Se crime é cometido em concurso, o concorrente que o denunciar à autoridade, facilitando a libertação do sequestrado, terá sua pena reduzida de um a dois terços.
Artigo 13:
  • Poderá o juiz, de ofício ou a requerimento das partes, conceder o perdão judicial e a consequente extinção da punibilidade ao acusado que, sendo primário, tenha colaborado efetiva e voluntariamente com a investigação e o processo criminal, desde que dessa colaboração tenha resultado:
  • I – a identificação dos demais co-autores ou partícipes da ação criminosa;
  • II – a localização da vítima com a sua integridade física preservada.
  • III – a recuperação total ou parcial do produto do crime.
  • Parágrafo único: a concessão do perdão judicial levará em conta a personalidade do beneficiário e a natureza, circunstâncias, gravidade e repercussão social do fato criminoso.
Artigo 14:
  • O indiciado ou acusado que colaborar voluntariamente com a investigação policial e o processo criminal na identificação dos demais co-autores ou partícipes do crime, no caso de condenação, terá sua pena reduzida de um a dois terços.
 
E se for mentira?
Se o réu que entrou na delação premiada mentir ao juiz ele será penalizado e processado por “delação caluniosa” e poderá ser condenado de dois a oito anos de prisão por ter faltado com a verdade em suas informações.
O Brasil está atrasado no que tange à proteção das testemunhas e das vítimas, e até dos próprios co-autores e partícipes da ação criminosa. No Brasil, mesmo com um reclamo social efetivo e constante por uma legislação e agora com a Lei n. 9.807/99, em pleno vigor desde julho, ainda não se percebe uma preocupação e uma sensibilidade para a importância dos programas protetivos pelas autoridades competentes. Claro que já se tem um avanço fenomenal em um país mal acostumado com a necessidade de uma base profissional para investigação criminal, merecendo elogios o trabalho realizado pelo Programa Nacional de Direitos Humanos, responsável direto pela sensibilização do Congresso Nacional para formulação e aprovação da referida Lei.
           No entanto, tal Lei é essencialmente dirigente, exigindo que se faça um trabalho político, com destinação de verbas e com uma disponibilidade orçamentária que, apesar dos pesares econômicos, não exigirá quantias nem mesmo significativas dos cofres públicos. Tal conclusão é reforçada quando se lembra da importância fundamental de proteção das testemunhas e das próprias vítimas que nem mesmo chegam a ir à Polícia denunciar os crimes testemunhados. Quando muito, apenas denunciam anonimamente, havendo uma investigação que, ao final, acaba "não dando em nada", isto é, sem subsídios probatórios para identificar os criminosos e condená-los. A denúncia anônima, apesar da vedação constitucional do anonimato, é um poderoso instrumento que a Polícia tem para impedir alguns crimes, assim como encontrar produto de crime e até, em alguns casos, encontrar a vítima e em outros casos raros, levar os criminosos à condenação. A denúncia anônima prova a imensidão de pessoas que, diante de um juiz, poderiam levar, ao menos, indícios, quando não a própria prova desejada para encontrar a verdade real e, encontrando-a, haver condenação e impor justiça.

terça-feira, 6 de novembro de 2012

O Novo Codigo Penal Traz Perdas Insuperavéis.

         Os senadores já apresentaram 109 emendas ao projeto do novo Código Penal (PLS 236/2012), que está sendo examinado por uma comissão especial. Com suas emendas, os parlamentares marcam posição sobre temas que desde o início vêm-se revelando polêmicos, como a descriminalização do porte ou plantio de drogas para uso próprio. Autor de proposição sobre o tema, o senador Tomás Correia (PMDB-RO) defende a supressão do dispositivo do anteprojeto elaborado pela Comissão de Juristas designada pelo Senado que sugere tratamento mais liberalizante em relação ao consumo de drogas. Para o senador, a descriminalização poderá gerar sérios problemas de saúde pública e, ainda, agravar o problema do tráfico de drogas. A seu ver, seria ingênuo pensar que a medida não irá aumentar a procura por entorpecentes. Como haveria maior procura, a tendência é que também a oferta seja ampliada.
         De forma indireta, portanto, estar-se-ia incentivando a prática de conduta que há algum tempo vem se mostrando um dos problemas mais sérios que assolam o nosso país, que é o tráfico de drogas”, argumenta na justificação. Entre os que registraram emendas sobre o assunto, o senador Francisco Dornelles (PP-RJ) afirma que a redação proposta para o aborto aproxima a legislação brasileira “da descriminalização sem critérios, contrariamente aos interesses da maioria da sociedade brasileira”. Como alternativa, ele sugere que o aborto sempre seja fato “ilícito e culpável”, mas admitindo a isenção de pena quando praticado por médico em apenas duas situações: se não houver outro meio de salvar a vida da gestante ou se resultar de estupro, dependendo de consentimento da vítima ou, quando se tratar de pessoa juridicamente incapaz (menor, por exemplo), de seu representante legal".
         Prisionalização que não combate a seletividade. Recrudescimento da execução. Eficácia que esvazia até o processo. Eles se propuseram a fazer um código sem ideologias. Pragmático, mais que dogmático. Atual, mais do que isso, moderno. Naufragaram – o projeto do Código Penal faz água por todos os lados. Não por ser simplesmente reacionário -está salpicado de boas intenções, aqui e acolá, reduzindo certas penas e expungindo parte da punição moral do direito. Mas não deixa de ser um adepto incondicional da eficácia. Acredita em demasia no direito penal e em seu poder simbólico -por isso mesmo não se constrange em mantê-lo grande, nem se incomoda com o intenso recrudescimento da execução penal e as tétricas consequências que pode provocar com isso. Como toda obra com decisiva influência do marketing, não entrega aquilo que promete. Deseduca, ao perseverar na ideia de um direito penal majestoso, que responda a todos os problemas e seja a solução para a criminalidade. Flerta com o autoritarismo, ao trazer para o campo penal a solução dos mais variados conflitos, e é mais inepto sintomaticamente onde inova. A incorporação de teorias soa às vezes, incômoda, mas a redação de novos tipos demonstra ainda mais imprecisão.

           O projeto abre mão de conceitos para abraçar o mundo em busca da eficácia, e em certas situações se vê a meio caminho do grotesco. Que se pode dizer de um código gigantesco, que ainda encontra condutas para criminalizar, que se torna mais extravagante que a legislação que incorpora e que é dedicado, na apresentação de seu relator, a duas vítimas infantes de crimes de grande repercussão?. Um trabalho que joga para a plateia -e como se espera de todo esse apego demagógico, resulta em um estrondoso fracasso de crítica. O projeto é um espelho de sua produção. Seus juristas mais falaram que ouviram; deram mais entrevistas que debates. Buscaram reproduzir nas suas votações internas os consensos e conflitos de acadêmicos que não escutaram. Ao final, o texto é apressado, confuso e, muitas vezes, contraditório. Pretensioso, ainda esvazia o processo penal, estilhaçando sua noção de garantia, através do utilitário instituto da barganha.
 
Tem avanços, em especial ao reduzir a tutela da propriedade. Mas é tímido em alguns acertos e tíbio quando se obriga, em razão destes, a ceder a cada momento ao rigorismo, especialmente na execução penal. Dá, enfim, algumas no cravo, outras tantas na ferradura. Ao final, o trabalho não se compromete nem mesmo com suas próprias bandeiras. Sua criminalização não atende aos princípios que estipula. Suas concessões a um direito penal máximo comprimem acertos. Ademais da falta de ideologia, portanto, o pragmatismo também se sai fortemente ameaçado. Sem a pretensão de um trabalho exaustivo (pois exaustivo demais é o próprio projeto), compartilho algumas das principais preocupações após uma primeira impressão. Somadas as críticas já veiculadas de comentaristas mais gabaritados, só se pode concluir que o atual estágio de tramitação está anos-luz na frente de onde o texto merecia estar a esta altura: proposta para começar a discussão, jamais um projeto na iminência de se transformar em lei. Não cabe aqui acolher a escusa da imprudência. Se o Código Penal é, como diz o presidente de sua comissão, a lei mais importante abaixo da Constituição (e por aí já se vê o prestígio exacerbado que a comissão deu a seu mister e ao próprio direito penal) ela jamais poderia ter caminhado dessa forma tão sobranceira e auto-referente. O principal defeito do sistema penal brasileiro não é a impunidade –mas a seletividade. Faltam vagas para a extensa população carcerária, que cresce a cada dia –mas não há pluralidade de classes nas celas. Elaborar um Código Penal significa, em primeiro lugar, ter em mente este problema, bem ainda as consequências da força do instrumento que é. Como a experiência tem nos mostrado, enrijecer o sistema penal em busca de nova clientela dificilmente resolve o problema da seletividade, pois os princípios do rigor, mais hora, menos hora, acabam sendo replicados também aos mais vulneráveis que contam com o outro lado da seletividade –a maior fiscalização e a menor possibilidade de defesa. Só a diminuição do direito penal permite reduzir o impacto gravoso do Estado sobre a população mais carente. Mas em alguns momentos, o candidato a legislador parece agir com alguma espécie de privação de sentidos. Ou não consegue compreender o caráter nocivo do direito penal ou, premido pela expectativa social que quer afagar, não consegue se comportar de acordo com essa compreensão. 
  • "O Código reconhece, enfim, o princípio da insignificância, trazendo à lei critérios que vem sendo utilizados pela jurisprudência do STF. Pela imensidão de insignificâncias que a redação exige (mínima ofensividade da conduta, reduzidíssimo grau de reprovabilidade, inexpressividade da lesão) muito provavelmente vai levar o intérprete que naturalmente o exclui por falta de previsão a exclui-lo por ausência de seus requisitos –e ainda pode constranger os que já o aplicam. Não à toa, o infeliz exemplo trazido pela Exposição de Motivos foi justamente a do furto de alfinete".
        Aliam-se a esses dispositivos benéficos "ma non tropo"¸ a redução da pena de furto e roubo –também de uma forma constrangida. O furto simples passa a ter pena mínima de seis meses. Diferentemente de uma plêiade de tipos em que os padrões se repetem no Código entre 6 meses e dois anos, neste caso, a timidez levou os autores a fixarem três anos como máxima, com o propósito de impedir que o delito possa ser inserido entre os de menor potencialidade ofensiva –onde de fato deveria estar. Para não perder a mão apenas na entrega, o projeto incorpora à extensão da coisa móvel, o sinal de televisão a cabo ou de internet e item assemelhado que tenha valor econômico –resolvendo, de forma mais gravosa antigo dissenso jurisprudencial. E, pior, abre mão do próprio sentido de crime contra o patrimônio, ao inserir uma inusitada equiparação à coisa móvel do documento de identificação pessoal.

segunda-feira, 5 de novembro de 2012

A Uniformalização Jurisprudencial nos TRT´S.


          Atualmente o Direito do Trabalho e o Direito processual do trabalho utilizam-se tanto de um direito baseado em normas, como no baseado em pareceres, uma vez que os dois têm quase a mesma importância. Essa dualidade de tipos de doutrina de fontes de direito indica uma dificuldade imensa de se propor ou alterar qualquer legislação trabalhista. A consolidação da jurisprudência reiterada no âmbito do Direito do trabalho também tem como objetivo reduzir a possibilidade de ações, em especial de recursos. Apontando como o tribunal decide a questão, a consolidação visa diminuir o número de recursos trabalhistas, que vem aumentando, uma vez que as ações trabalhistas cresceram assustadoramente nas duas últimas décadas. Reduzir a quantidade de recursos é um dos instrumentos para se tentar dar conta de equacionar a equação complicada entre a demanda de ações crescente e a infra-estrutura da justiça trabalhista brasileira.
          O tribunal tem tomado para si a função de estabelecer parâmetros legais através de uma compilação de sua jurisprudência reiterada. O Tribunal Superior do Trabalho vem criando uma verdadeira “Consolidação da Jurisprudência do Trabalho”, que hoje é tão ou mais importante para os que atuam na área do trabalho quanto à Consolidação das Leis do Trabalho. A jurisprudência é sim fonte do Direito. Entende-se direito aqui como uma significação imaginária social. O conceitual do filósofo grego é utilizado para pensar como a jurisprudência vem sendo legitimada como uma fonte do Direito, apesar de conceitualmente ainda haver resistências a essa posição. É a partir desse conceitual que se propõe uma discussão sobre temas que rondam a jurisprudência no Direito do trabalho, como: segurança jurídica, defesa da legalidade estrita, papel criador ou não do magistrado e direito como sistema.

"A teoria das fontes do Direito surge como tentativa de elencar quais seriam as normas legitimadas para se chamar de Direito. Assim, a teoria das fontes é um produto da sistematização do Direito do estatal em normas que poderiam ser conhecidas por todos. Ao se falar em fonte do Direito, não há apenas diversos sentidos para a palavra fonte, mas também para a concepção de Direito. Porém, na expressão fonte do Direito o que geralmente se entende por Direito é o Direito estatal, em especial, a legislação".

          A importância da utilização da jurisprudência como fonte do direito é diferente em países de um Direito de tradição romana e do Direito da Common Law. Ao tratar da jurisprudência como fonte de Direito, destaca que nos países em que o Direito estava pautado nas codificações, chegou-se a proibir que as decisões dos tribunais fossem utilizadas como fontes de Direito. De acordo com esse autor, o posicionamento do Direito da Common Law é distinto, permitindo a utilização da jurisprudência, como fruto de um direito calcado na prática e não na academia e na erudição, como o direito de tradição continental. Kelsen aceita a jurisprudência como fonte do Direito, uma vez que entende que o magistrado é legitimado pelo Estado para proporcionar a interpretação autorizada. A decisão do magistrado não tem validade para outros que não aqueles que estão na decisão, porém para as partes no processo a sentença faz lei.
“Mas a decisão judicial também pode ser considerada como fonte dos deveres e direitos das partes litigantes por ela estatuídos, ou da atribuição de competência ao órgão que tem de executar essa decisão”.
          A discussão sobre a possibilidade do judiciário, seja por seus magistrados ou mesmo em um tribunal, elaborar normas a serem seguidas, esbarra na questão de ultrapassar os limites do judiciário ao se tomar para si um papel legislativo. Porém, essa questão já muito debatida, perde de certa forma a força, quando se admite que o poder judiciário tenha como papel principal julgar e como secundário legislar ou executar, o mesmo se dando com os outros poderes. A discussão está em ser também a função do judiciário criar normas, quando estas não existirem. “Isto significa que o tribunal recebe poder ou competência para produzir, para o caso que tem perante si, uma norma jurídica individual cujo conteúdo não é de nenhum modo predeterminado por uma norma geral de direito material criada por via legislativa ou consuetudinária. Neste caso, o tribunal não aplica uma tal norma geral, mas a norma jurídica que confere ao tribunal poder para esta criação ex novo de direito material. Costuma dizer-se que o tribunal tem competência para exercer a função de legislador. Isto não é completamente exato quando por legislação se entenda a criação de normas jurídicas gerais. Com efeito, o tribunal recebe competência para criar apenas uma norma individual, válida unicamente para o caso que tem perante de si. Mas esta norma individual é criada pelo tribunal em aplicação de uma norma geral tida por ele como desejável, como ‘justa’, que o legislador positivo deixou de estabelecer”.
 

De fato, o que ocorre nos Tribunais divididos em Turmas, Câmaras ou Grupo de Turmas é que estas possuem a competência para o julgamento do recursos e, entre órgãos do mesmo Tribunal, existe uma divergência quanto à matéria de Direito aplicável ao caso; de forma que se faz necessário, conforme disposto nos arts. 476 a 479 do CPC, que o Tribunal Pleno determine (e apenas isso) qual a tese a ser aplicada e, se for o caso, que seja constituído um precedente de jurisprudência. A propósito, traz-se à colação julgado do TRT da 23ª Região, que analisando incidente de Uniformização de Jurisprudência à luz do disposto na lei 7.701/88, decidiu:
"INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA. NÃO CABIMENTO. O fato deste Regional não ser dividido em Turmas é, certamente, o motivo determinante que impede que o presente incidente de uniformização seja aqui apreciado e julgado, visto que tanto a doutrina como a jurisprudência, em sua maior parte, admite o incidente de uniformização apenas nos Tribunais divididos em Turmas ou Grupo de Turmas." (DJ/MT do dia 30/06/97)
          Para ilustrar, nos albergues da doutrina mais abalizada, Pontes de Miranda, em seus comentários ao Código de Processo Civil, Tomo VI. Editora Forense, relatando a História sobre a uniformização de jurisprudência, mostra que, desde a origem, sempre houve uma cisão no julgamento de forma que o órgão competente para julgamento do recurso jamais foi o responsável pela determinação da matéria jurídica aplicável. Assim ocorreu, com os assentos previstos nas Ordenações Filipinas, Manuelinas; nos prejulgados previstos no Dec. 16.273/23 (sobre a organização judiciária do Distrito Federal) e nos Código de Processo Civil e Comercial de São Paulo e outros. De forma que o novo dispositivo em comento, mesmo quanto à experiência do passado, quanto aos Tribunais não divididos, se nos aparenta impraticável.
          Por outro lado, o argumento de que divergências jurídicas, geram insegurança aos jurisdicionado e ofendem o princípio da igualdade de todos perante a lei – o que justificaria a atuação legislativa -, deixa de levar em consideração que em nosso sistema legal, em se tratando de Processo do Trabalho, admite-se a possibilidade de divergências nos julgamentos dos Tribunais Regionais, tanto que esta se constitui em pressuposto para Recurso de Revista, e atribui ao TST, como órgão de última instância recursal, a tarefa de uniformizar as jurisprudências, sem que isso se constitua ofensivo ao princípio da igualdade de todos perante a lei.

sábado, 3 de novembro de 2012

Contra Tudo e Todos - És MINISTRO JOAQUIM BARBOSA.

          A criação do Supremo Tribunal Federal (STF) data de alguns meses após a proclamação da república, mais especificamente pelo Decreto nº510 de 22 de junho de 1890, que estabeleceu uma Constituição Provisória da República dos Estados Unidos do Brasil. Com o fim do regime monárquico foi necessária a definição de a quem caberia a última instância para a resolução de conflitos públicos e privados, já que essa função era anteriormente do Imperador devido ao Poder Moderador. A idéia de se criar um órgão responsável pela guarda da constituição à semelhança da Suprema Corte americana, entretanto, antecede a própria república, pois D. Pedro II já havia pensado em criar instituição semelhante no Brasil, que assumisse muitas de suas responsabilidades, assim como as do Conselho de Estado. Muitos dos ministros que inicialmente foram nomeados para o Supremo Tribunal Federal, cuja composição era de quinze juízes, eram do antigo quadro do Supremo Tribunal de Justiça do Império, que possuía funções típicas de cassação do modelo europeu, estando sempre subordinados ao imperador, o que provocou frustrações na época, pois muitos, como, por exemplo, Rui Barbosa, "esperavam uma pronta ação do novo Poder Judiciário".
          Desde a sua criação, o Supremo Tribunal Federal tem mantido com algumas alterações — principalmente as introduzidas pela Constituição de 1988, que serão desenvolvidas adiante — as funções que lhe foram atribuídas inicialmente. Como entre as suas funções primordiais estão as de decidir acerca da constitucionalidade dos atos dos demais poderes, assim como julgar os conflitos envolvendo a União e os Estados, e defender em última instância os direitos fundamentais consagrados, sua história tem sido tumultuada. Pressões do poder executivo, limitações de sua competência e intervenções, são exemplos do que sofreu o STF ao longo se sua história, mas a resistência a essas pressões, entretanto, não tem sido uma constante na sua atuação.

                                                 
  • "Num país onde as sublevações e os golpes de estado se repetem, as constituições se sucedem e o estado de direito tem sido várias vezes interrompido por períodos de exceção; num país em que o Executivo, de tempos em tempos, ignora dispositivos constitucionais, dissolve o Congresso, governa por decreto, cria atos institucionais que contrariam a Constituição, declara estado de sítio durante o qual ficam suspensas as garantias constitucionais, prende e desterra cidadãos sem qualquer processo; num país cujos governantes se recusam às vezes a obedecer às decisões emanadas da mais alta Corte de Justiça, interferindo diretamente nela, negando-se a preencher vagas ou alterando o número de ministros – é de se esperar que esta funcione como uma caixa de ressonância que registra os ritmos agitados da história nacional."
          O artigo 102 da Constituição, na sua redação originária, dividiu as competências do Supremo Tribunal Federal em originárias (I, aa q), nas quais o STF atua como juízo único e definitivo; e recursais, que podem ser ordinárias (II, a e b) ou extraordinárias (III, a a c). Na sua competência recursal ordinária o STF julga o crime político e o habeas corpus, mandado de segurança, habeas data e o mandado de injunção, decididos em única instância pelos Tribunais Superiores, quando a decisão tiver sido denegatória. Na sua competência recursal extraordinária o STF analisa as decisões dos tribunais inferiores que impliquem em violação à Constituição, sendo o órgão máximo do chamado controle difuso de constitucionalidade.
           Com a criação do Superior Tribunal de Justiça, foi transferida ao mesmo a competência, que antes era do STF, de última instância recursal no que se refere à interpretação e aplicação da lei federal, através do recurso especial. As grandes inovações na competência do STF dizem respeito, entretanto, a parte de sua competência originária relativa ao chamado controle abstrato de constitucionalidade. As demais competências originárias do STF — como, por exemplo, julgar o Presidente da República nas infrações penais comuns — foram basicamente mantidas pela CF/88. Apenas com a Emenda Constitucional (EC) nº 45/2004, que a competência originária de homologar sentenças estrangeiras e conceder exequatur às cartas rogatórias, foi repassada ao STJ.
  • MINISTRO DO STF JOAQUIM BARBOSA
         Eleito presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) nesta quarta-feira (10) por nove votos a um, o ministro Joaquim Barbosa é o primeiro negro a assumir o cargo. O magistrado assumirá mandato de dois anos no dia 18 de novembro, quando o atual presidente da Corte, ministro Carlos Ayres Britto, se aposentar. Por ser negro, ter tido uma história de vida de superação, além de ocupar um cargo de destaque no STF, ser incisivo em suas decisões, ter postura determinada e destemida, não medir palavras para rebater críticas principalmente durante o julgamento da ação penal do mensalão, Joaquim Barbosa ganhou destaque e admiração nacional.
 Joaquim Barbosa, em entrevista para o jornal O Globo, afirmou que era de uma família pobre, e que lutou para conseguir estar onde está hoje. Segundo o ministro, assim como ele outras pessoas também se esforçam para vencer na vida, mas que não conseguem porque o sistema educacional cria mecanismos poderosos de exclusão de negros.
  • MARCAS DO RACISMO NA SOCIEDADE:
          De acordo com o sociólogo Yan Tavares, não se pode negar que o racismo no Brasil faz parte do processo histórico marcado pela escravidão, e que as marcas ainda estão presentes na sociedade, mesmo que de forma mascarada. “Podemos identificar facilmente casos de discriminação velada em empresas, escolas, universidades e até na mídia, quando só vemos protagonistas de cor branca, quando se existe ótimos atores negros mas que não ganham papel de destaque na trama”, disse. Segundo o sociólogo, casos como o de Joaquim Barbosa são pontuais. “Ocupar espaços de grande importância na sociedade não se dão por acaso e se devem à competência do indivíduo. Acredito que a eleição dele não se deu à toa, já que o ministro tem uma história de muita dedicação e estudo”, informou.
  • REDES SOCIAIS E O COMBATE AO PRECONCEITO:
          O sociólogo afirma também que as redes sociais desempenham um importante papel social na discussão destes assuntos. “Antes de as redes se tornarem comum no dia a dia das pessoas, debates sobre racismo só se davam em espaços fechados, como por exemplo em sala de aula, quando o professor colocava em pauta a discussão. Hoje a discussão é constante e a difusão das opiniões é rápida”, disse Tavares.
  • HISTÓRIA:
          Joaquim Barbosa, mineiro da cidade de Paracatu, é filho de dona de casa e de pedreiro. Foi faxineiro e trabalhou na gráfica de um jornal. Aos 16 anos foi para Brasília para terminar o curso secundário. Tornou-se professor universitário e procurador do Ministério Público Federal. Prestou concurso público e foi aprovado para o cargo de procurador da República, durante a gestão do ex-ministro Sepúlveda Pertence como procurador-geral da República, fez mestrado na Universidade de Brasília (UnB) e doutorado na França. Em 2003 foi nomeado pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva ministro do STF.
          Segundo o Ministro Joaquim Barbosa, a  realização constitucional, ou seja, tornar juridicamente eficazes as normas constitucionais, é tarefa que cabe não só aos Poderes do Estado, mas todos que tem na Constituição a emanação de seus direitos e deveres. Entretanto, aos agentes públicos, a quem a Constituição confere maior poder e responsabilidade, cabe uma parcela maior dessa tarefa realizador. Com a redemocratização do país e a promulgação da Constituição de 1988, o STF teve o seu papel institucional ampliado como nunca antes em sua história. Com isso, aumentou, também, a sua importância e responsabilidade para com a realização constitucional.
          Deste modo, ao STF, a quem foi destinada a guarda da Constituição, cabe buscar sempre pela efetividade dos direitos fundamentais consagrados e impedir a violação dos preceitos constitucionais, seja por ação ou omissão. Do breve relato de sua história verificamos, porém, que essa é uma atribuição que nem sempre se consegue exercer sem conflitos.

sexta-feira, 2 de novembro de 2012

Separações e Divorcios. Tempo Perdido.?

        
          Com a publicação da Emenda Constitucional 66, os casais que desejam se divorciar podem fazê-lo sem a necessidade da separação prévia. A medida extinguiu os prazos que eram obrigatórios para dar entrada no pedido. Ainda que essa seja a mudança básica da proposta — a questão dos prazos — há dúvidas em relação à aplicabilidade e entendimentos sobre os processos que já estão em andamento e em algumas situações específicas. Um dos principais responsáveis pela mudança que acelerou o pedido de divórcio é o Instituto Brasileiro de Direito de Família (Ibdfam). A Entidade afirma que as mudanças seguem uma tendência de menor intervenção do Estado na vida do cidadão, e que os contrários à aprovação adotam um discurso moralista “perigoso”. “Quando alguém vai casar é preciso o aval do Estado, no sentido de perguntar há quanto tempo o casal está junto? Não, portanto, no divórcio funciona da mesma forma. Sem contar que, a partir desta emenda, há uma transferência de responsabilidade para as pessoas, porque elas podem fazer o pedido quando acharem melhor e terão de responder por suas escolhas.”

          Para ele, a separação judicial é um instituto anacrônico, sustentado por um discurso religioso. “A separação era um atraso na vida daqueles que queriam se divorciar. Sem contar que ela acabava fomentando uma discussão sem fim em relação à questão da culpa sobre o fim do relacionamento, estimulando aquelas famosas brigas que todos conhecem. Na verdade, da forma como ocorria, o sofrimento acabava sendo dobrado, porque havia a necessidade de fazer a mesma coisa duas vezes”, comenta. Além disso, Pereira acrescenta que a separação de corpos, por exemplo, foi valorizada com as novas regras, já que continua sendo possível tirar o cônjuge de casa quando houver motivos suficientes para isso, desde que comprovada a responsabilidade pelo ato. Na mesma linha do Ibdfam, ele elogia o fato de a culpa deixar de ser discutida. “Era prejudicial, porque sempre resultava nas chamadas lutas de balcão, nas quais os casais ficavam discutindo sobre a culpa pela separação. Sem contar que, a partir de agora, vai desafogar as pautas de julgamento dos tribunais. Em resumo: são menos problemas e tudo está mais prático e barato.
 
 
          O divórcio, quando ocorre, ou quando sua possibilidade se torna real na vida dos casados, é uma das mais importantes crises da vida do adulto. No casamento, ambos os parceiros mudam ou evoluem com os anos, geralmente em diferentes ritmos, e não necessariamente em direções complementares, podendo surgir a necessidade de separação.
          Assim, diante de um casamento não satisfatório, começam a surgir inúmeros problemas no convívio e no relacionamento, que chamaremos aqui de desajustes conjugais. Ocorrendo a separação, ambos os ex-parceiros , independente de quem tenha tomado a iniciativa, passam por um período de sofrimento em decorrência da perda da relação, por pior que essa estivesse no período imediatamente anterior ao divórcio. A maior facilidade legal para o divórcio e a diminuição da influência da religião com dogmas rígidos tornaram a separação um acontecimento mais aceitável, com as pessoas separadas sofrendo menor preconceito que no passado. Uma mostra disso é o fato de no Brasil desde 1940 até 2010 , segundo o IBGE, o percentual de pessoas divorciadas, na população em geral, aumentou aproximadamente 15 vezes. Outro aspecto que contribuiu foi a busca mais acentuada pelo bem-estar individual, através da maior oferta de prazer (real ou ilusória) na sociedade atual para aqueles que abrem mão da vida a dois. Como se perpetuam relações desajustadas no casamento.
Em um casamento, quando ocorre um desajuste conjugal, a responsabilidade pelo problema é de ambos os cônjuges, mesmo que aparentemente a situação aponte para um único responsável. Isso porque ocorre o que pode ser chamado de acordo inconsciente entre os dois no casamento, isto é : um problema que aparentemente é de apenas um dos cônjuges, é, em geral, compartilhado ou até mesmo aceito pelo outro. Assim, uma pessoa ao se casar ou manter-se casada o faz pelas virtudes do parceiro ou da própria união. Porém, com as virtudes, aparecem as diferenças e até mesmo os problemas.
          Questões sócio-culturais também são muito importantes na manutenção de casamentos muito desajustados, principalmente em culturas e classes sociais em que a mulher (ou o homem) tem uma educação rígida em relação ao casamento, não tendo uma vida pessoal própria, independente, mesmo profissionalmente, em que o casamento e a maternidade são vistos como meio de vida, muitas vezes por necessidade e não como opção. Além disso, muitos casamentos mantêm-se pela extrema dependência afetiva dos cônjuges um do outro, que faz com que desajustes intensos no casamento sejam tolerados, de modo que a tristeza pela perda do casamento seja intensa ou até insuportável, não permitindo uma separação mesmo que os problemas conjugais sejam vários. Da mesma forma que ocorre com o casamento, o divórcio é uma questão única para cada dupla que se separa. Geralmente a separação é mais comum entre casais que se uniram na adolescência ou entre membros de diferentes níveis sócio-econômicos e culturais. Também pessoas cujos pais eram separados têm maior tendência a resolver um problema conjugal optando pelo divórcio. Outra experiência provocadora de tensões no casamento é a paternidade, fazendo com que o parceiro sinta menos prazer com o outro após o nascimento de filhos.
A presença de doença nos filhos também gera uma tensão ainda maior, sendo que casamentos em que um dos filhos morre por doença ou acidente têm uma tendência de cerca de 50% em terminarem no divórcio.
A separação em geral força a pessoa, antes mesmo de separar-se, a tornar-se autônoma, a sair de uma posição de dependência, sendo que esta posição pode ser difícil de ser conquistada, especialmente se ambas as pessoas estão acostumadas a serem dependentes uma da outra (como normalmente acontece no casamento, em que há dependência e uma certa mistura da vida de duas pessoas, para que ele exista satisfatoriamente.
          Mais comumente, a iniciativa da separação parte apenas de um dos cônjuges. Por vezes este poderá enfrentar sentimentos de culpa, principalmente se o casal possuir filhos, o que intensifica a dúvida da separação. A pessoa que toma a iniciativa poderá sentir-se causadora de sofrimento aos filhos, a si própria e até mesmo ao cônjuge de quem está separando-se, principalmente se esse mostra-se muito fragilizado com a possibilidade do divórcio. De modo similar, pode ocorrer o medo e a incerteza diante do futuro da vida de descasado, com os sentimentos de abandono, de solidão e de vazio pela perda da relação conjugal. Por outro lado, o divórcio coloca na balança o sofrimento que pode ser causado pela permanência em um casamento insatisfatório. A pessoa pode sentir-se sacrificada dentro de uma relação que não lhe permite satisfação pessoal. O amadurecimento pessoal de cada um, se for desigual ou em direções muito diferentes, pode afastar as pessoas, de modo que a permanência da união poderá causar problemas emocionais para um ou para ambos. Da mesma forma, uma escolha do cônjuge que não foi madura, em uma época muito inicial da vida ou baseada em aspectos psicológicos doentios, como foi descrito anteriormente, pode fazer o casamento tornar-se difícil de ser mantido, marcado por sentimentos de raiva do cônjuge, ou de tristeza e depressão, existindo um sentido de obrigação para manter o casamento e não um desejo sincero e maduro de mantê-lo e desfrutá-lo. Além disso, muitos casamentos podem se manter por aspectos psicológicos pouco sadios, com poucos sentimentos de amor, carinho, respeito, podendo predominar desprezo, raiva, inveja, que resultam em uniões marcadas por competição, constantes acusações, brigas, agressões físicas, ou dependência doentia de um ou de ambos os casados.

         Sendo o divórcio uma crise importante na vida das pessoas que o enfrentam, muitos procuram algum tipo de tratamento psicológico em decorrência do mesmo, seja antes, durante, ou após a separação. A maioria das pessoas, contudo, não o fazem, seja por não sentirem necessidade, seja por falta de condições (ou não possuírem algum tratamento acessível) ou por falta de conhecimento a respeito de auxílios psicológicos. Além disso, muitas vezes, no senso comum, existe a idéia de que tratamentos psicológicos (psiquiátricos, psicoterápicos ou psicanalíticos) fazem com que a pessoa que se trata termine por se separar. Entretanto, tratamentos psicológicos bem orientados objetivam reduzir as perturbações no relacionamento, muitas vezes favorecendo a manutenção do casamento e o enriquecimento do vínculo afetivo do casal. Além disso, muitas pessoas podem sentir necessidade de tratamento após a separação, justamente pela perda que esta envolve, ou pelas modificações de vida decorrentes da mesma. Por último, no casamento podem ressurgir problemas psicológicos de um ou de ambos os parceiros anteriores ao próprio casamento, mas que se exacerbam durante a vivência a dois ou em família.