A Polícia Federal (PF) vai investigar, a pedido da Ordem dos
Advogados do Brasil (OAB), dois perfis de redes sociais que ofenderam
nordestinos na semana passada. A solicitação foi assinada pelo
presidente da Ordem, Marcus Vinícius Furtado Coêlho.
A
solicitação foi feita com base na Lei de Racismo, que considera crime a
discriminação de procedência nacional. O pedido foi motivado por uma
série de tuítes e postagens no Facebook que sugeriam a construção de um
muro separando Nordeste e Norte das Regiões Centro-Oeste, Sudoeste e
Sul. As mensagens surgiram após a vitória da presidente Dilma Rousseff
(PT) na corrida presidencial.
O pedido de investigação chegou
nesta segunda-feira (3) à Direção-Geral da polícia, e o inquérito deverá
ficar sob responsabilidade da unidade de repressão a crimes
cibernéticos.
Exemplos como esses não são difíceis de ser
encontrados na internet. Bastam poucos minutos nas redes sociais que
entre fotos, elogios, agradecimentos e brincadeiras elas estão lá: as
agressões verbais. Palavras, muitas vezes, de baixo calão que tem
objetivo único de reforçar um ponto de vista a partir de ataques a
outras pessoas. Estamos falando de atos motivados por intolerância à
cor, gênero, ideologia política ou religião, entre outros.
O
perfil do deputado federal, Jean Willys (PSol) na rede social Facebook é
um espaço onde este tipo de manifestação acontece com frequência, e
muita frequência. A maioria deles é motivada por defesas da família e
críticas à homossexualidade.
Um posicionamento bem diferente em
relação a várias questões comuns também recebe o mesmo tipo de
tratamento. A reportagem também acessou o perfil do pastor e líder do
ministério Vitória em Cristo, ligado à Igreja Assembleia de Deus e
conferiu que ele também recebe o mesmo tipo de atenção deselegante. É
uma verdadeira guerra virtual. Minorias de posições divergentes usam os
espaços para atacar um ou outro.
Conforme o Instituto Brasileiro
de Geografia e Estatística (IBGE), 50,1% dos brasileiros estavam
conectados à internet em 2013. Uma pesquisa Ibope/YouPix de julho de
2013 mostrou que 92% dos jovens do País que acessam a internet usaram
redes sociais. Mesmo quando se leva em conta o total de pessoas que
navegam na rede, de todas as idades, são 78% acessando algum tipo de
rede social. A maior parte não pratica os atos citados acima, mas mostra
que essa minoria não é uma quantidade pequena de pessoas em números
absolutos.
O presidente da Comissão de Direito Digital e
Informática da Ordem dos Advogados, Tabajara Póvoa acredita que o fato
de a internet e as redes sociais serem algo relativamente novo faz com
que as pessoas tenham atitudes impensadas. “Nós estamos despreparados
para lidarmos com essas questões. Não é só entregar o computador para a
criança, para o adolescente. É preciso fazer as pessoas perceberem as
consequências do uso inadequado”, alerta.
A socióloga da
Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC-GO), Eline Jonas, tem
visão semelhante à do advogado. Ela considera que esse comportamento de
parte da sociedade tem relação com a história do Brasil e com o recente
processo de redemocratização do País. Eline acredita que ainda não
aprendemos a lidar com os espaços de divulgação da opinião e acrescenta,
também, que a grande mídia tem sua responsabilidade neste processo. “É
uma prática de meios de comunicação, prática de redes públicas da TV
aberta que são tendenciosas, e cuja ideologia não correspondem à lisura
do jornalismo sério, ou não buscam a informação de maneira séria com
análise”, critica.
ORIGEM
Seja por qual
razão for, o desrespeito ao direito e ao posicionamento do outro ganha
proporções consideráveis na rede, vai se multiplicando em
compartilhamentos, retransmissões e comentários. Alguns se valem do
humor para carregar mensagens preconceituosas.
O mestre em
Psicologia e especialista em Psicologia Social Wadson Arantes entende
que existem vários motivos para o surgimento desta dificuldade em lidar
com ideias contrárias e isso faz parte de um processo. “O preconceito é
desenvolvido através das relações que a gente constrói no nosso dia a
dia.”
De acordo com o psicólogo, o diálogo com pessoas muito
afirmativas em seus posicionamentos não são tarefas fáceis porque elas
carregam em si uma resistência em ouvir. “Essas pessoas por trás dos
computadores, elas acham que vão se impor porque as verdades delas são
absolutas”, reforça.
A sensação de anonimato contribui para que
muitos ataquem com agressividade outros que pensam diferente de si. No
entanto, este sentimento é uma ilusão. O Marco Civil da Internet
estabelece que os provedores são obrigados a manter, por no mínimo seis
meses, os registros de identificação das máquinas no acesso à rede de
computadores.
Tabajara expõe que a legislação vigente é
suficiente para caracterizar crimes de injúria, calúnia e difamação,
sendo necessário apenas o agravamento das penas por causa da proporção
que as ações tomam no meio virtual. “Eu não defendo uma nova legislação.
Esses crimes já estão tipificados no Código Penal Brasileiro”, ressalta.
EDUCAÇÃO
Os
especialistas ouvidos pela reportagem do Diário da Manhã afirmam que
para que o cenário mude é preciso que a educação aborde com mais firmeza
temas como tolerância e respeito às diversidades, assim será possível
compreender a realidade alheia. “É muito triste, porque isso (a
intolerância) é a percepção que as pessoas têm das relações sociais”,
define Eline.
Saiba Mais
O que diz o Código Penal Brasileiro
Art. 140 – Injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro:
Pena – detenção, de um a seis meses, ou multa.
§ 1º – O juiz pode deixar de aplicar a pena:
I – quando o ofendido, de forma reprovável, provocou diretamente a injúria;
II – no caso de retorsão imediata, que consista em outra injúria.
§ 2º – Se a injúria consiste em violência ou vias de fato, que, por sua
natureza ou pelo meio empregado, se considerem aviltantes:
Pena – detenção, de três meses a um ano, e multa, além da pena correspondente à violência.
§ 3º Se a injúria consiste na utilização de elementos referentes a
raça, cor, etnia, religião, origem ou a condição de pessoa idosa ou
portadora de deficiência: (Redação dada pela Lei nº 10.741, de 2003)
Pena – reclusão de um a três anos e multa. (Incluído pela Lei nº 9.459, de 1997)
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